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sexta-feira, 12 de outubro de 2012

'Os pais conversam menos com os filhos do que a publicidade', alerta educadora

Segundo especialistas, para enfrentar o sedentarismo e consumismo infantil os pais devem dialogar mais e brincar com os filhos (Foto: Letícia Duarte/Flickr)         

São Paulo – Em plena semana da Criança – quando o comércio deve registrar nova alta nas vendas de brinquedos e outros produtos infantis – especialistas do Instituto Alana e da Aliança pela Infância reuniram-se ontem (9) em São Paulo para discutir os prejuízos trazidos pela publicidade dirigida às crianças e a importância do resgate do brincar como estratégia de enfrentamento.

“Os pais conversam menos com os filhos do que a publicidade. Estudos mostram que a criança brasileira é a que mais assiste TV entre as de todos os países. Diante da TV a criança é estimulada a comprar o tempo todo”, alertou a pedagoga Roberta Capezzuto, integrante do Núcleo de Educação do Instituto Alana, organização que defende o desenvolvimento saudável da criança em todos os aspectos. "E é muito fácil vender para crianças porque elas acreditam em tudo o que se diz.”

Segundo ela, a situação é preocupante. Pesquisas mostram que 30 segundos de exposição a uma propaganda é suficiente para que a criança seja influenciada por uma marca. Isso é muito preocupante porque estimula um consumismo prejudicial à infância e seus familiares. 

“Há prejuízos para o desenvolvimento físico e cognitivo das crianças uma vez que elas deixam de brincar para ficar na frente da TV por horas seguidas.” O resultado imediato da combinação sedentarismo e consumo de alimentos anunciados – 80% deles são calóricos, conforme pesquisas – é a obesidade na infância. Dados do Ministério da Saúde mostram que 33% das crianças brasileiras estão com sobrepeso. 

“Outro problema é a erotização precoce. Não é à toa que a primeira relação sexual aos 15 anos vem aumentando em todo o Brasil”, disse Roberta. Isso tudo sem contar o estresse familiar causado por chantagens dos filhos que, seduzidos pela publicidade, pressionam os pais para comprar os produtos anunciados durante a programação infantil, com linguagem acessiva e com apelos visuais. E o danos psicológicos são trazidos por comerciais que exibem a falsa ideia de famílias sempre perfeitas, quando na realidade todas as famílias enfrentam problemas em vários momentos. “Será justo culpar os pais pelo consumismo excessivo quando há uma indústria milionária por trás dessa pressão que vitimiza a criança?”, questionou. 

"Existem iniciativas para restringir a publicidade destinada ao público infantil. Mas todas sofrem ataques dos meios de comunicação, que argumentam que essas propostas ferem a liberdade de expressão", disse o jornalista Alex Criado, da coordenação da Aliança pela Infância. "Essa defesa da liberdade de expressão, no entanto, esconde interesses escusos."

Entre eles está o Projeto de Lei 193/2008, do deputado Rui Falcão (PT), que está pronto para ir ao plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo. A proposta regulamenta a publicidade, no rádio e TV, de alimentos dirigida ao público infantil. O PL proíbe no estado a publicidade dirigida a crianças de alimentos e bebidas pobres em nutrientes e com alto teor de açúcar, gorduras saturadas ou sódio entre as 6h e 21h. A proibição vale também para divulgação desses produtos em escolas públicas e privadas. A proposta veta ainda a participação de celebridades ou personagens infantis na comercialização e a inclusão de brindes promocionais, brinquedos ou itens colecionáveis associados à compra do produto. Já a publicidade durante o horário permitido deverá vir seguida de advertência pública sobre os males causados pela obesidade. 

O projeto está de acordo com o que prevê o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que proíbe qualquer publicidade enganosa ou abusiva que se aproveite da deficiência de julgamento e experiência das crianças. Em 2010, o Instituto Alana denunciou ao Procon a rede Mc Donald's por vincular brinquedos às promoções de seus produtos. Conforme a denúncia, a associação de brinquedos com alimentos incentiva a formação de valores distorcidos, bem como a formação de hábitos alimentares prejudiciais à saúde.

Além de criação de leis para proteger as crianças dos efeitos nocivos da publicidade, Roberta defende a ação conjunta de famílias, escolas, movimentos sociais, ONGs, empresariado e o estado. Em sua apresentação, ela mostrou o filme Criança, a alma do négócio, que mostra depoimentos de crianças, pais, professores e especialistas sobre consumismo e a vulnerabilidade das crianças à propaganda. Produzido em 2008, o filme continua atual. 

"Leis que defendem as crianças dos efeitos nocivos da publicidade existem, como a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o próprio Código de Defesa do Consumidor. Basta que sejam cumpridos", disse Roberta.

Em 28 países há restrição à publicidade voltada para crianças. Suécia e Noruega baniram a publicidade.

Brincadeiras de verdade

“O encurtamento da infância – as crianças estão deixando de brincar mais cedo e essa precocidade a transforma em consumidores – é uma questão que merece muita reflexão”, disse a educadora Adriana Friedmann, coordenadora da Aliança pela Infância. A entidade mantém 20 núcleos espalhados pelo país para pesquisar e disseminar a importância do brincar. 

Segundo ela, consumo não combina com infância. "Quando uma criança pede um brinquedo, é porque está angustiada. É como se ela dissesse: olha pra mim. Elas não sabem, mas estão dizendo isso."

Para Adriana, estão faltando coisas simples e essenciais nos relacionamentos familiares, como o preparo de uma comida com afeto, mais tempo para o diálogo e brincadeiras. "Precisamos organizar nosso tempo, pegar a criança no colo, contar uma história, cantar uma música – isso é brincar também. Hoje em dia, o maior presente que podemos dar a uma criança é estar com ela por inteiro.”

Adriana lembrou que o brincar mais livre, sem brinquedos estruturados, com a criatividade do faz-de-conta era comum até os anos 1950, 1960. De lá para cá os brinquedos foram sendo introduzidos e hoje as crianças – e adultos – são cada vez mais dependentes de aparatos tecnológicos, os brinquedos atuais. “A nossa sociedade está doente, hipnotizada pela tecnologia. As pessoas estão o tempo todo desconectadas da realidade, da pessoa ao lado, daquilo que é essencial nas relações sadias, e fixadas em aparelhos como o celular. Compramos para nós e para nossos filhos”, lamentou. 

Segundo Adriana, são muitas as questões para as quais não existem respostas prontas. “Precisamos olhar para dentro de nós mesmos, voltar à nossa infância, negociar com as crianças e dar a elas alternativas que ainda não conhecem, ensinar brincadeiras antigas e brincar mais com elas."

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Ressaca eleitoral e flexibilização trabalhista


Gostaria de chamar a atenção para um projeto em particular: o chamado “Acordo Coletivo de Trabalho com Propósito Específico”. O nome parece pomposo, mas o conteúdo é nitroglicerina pura: flexibilização dos direitos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho, a nossa CLT.
Paulo Kliass

A cada dois anos, o mês de outubro tende a ser dominado pela pauta e pela disputa política em torno das eleições. Até aí, tudo normal, faz parte das regras e da dinâmica do jogo democrático. E quando o pleito se refere à renovação dos cargos no plano municipal (prefeitos e vereadores), a agenda política nacional tende a ficar um pouco mais amortecida. Por mais que haja uma ou outra tentativa de “nacionalizar” o debate, o fato é que os assuntos do legislativo federal ficam no aguardo do início do mês de novembro. Isso porque tanto o Senado quanto a Câmara dos Deputados entram em uma espécie de “recesso branco”, uma vez que os parlamentares estão quase todos envolvidos com as candidaturas em suas bases pelo País afora.


Os problemas podem surgir após o término das eleições, quando a retomada da agenda acumulada coloca em risco a votação de temas sensíveis e polêmicos num ritmo de atropelo legislativo. É o caso da votação do Código Florestal e os retrocessos que podem ser introduzidos na legislação ambiental, caso o Executivo não assuma a iniciativa firme e decidida de se contrapor aos interesses da bancada ruralista. E um outro conjunto de itens volta à superfície, embalados pela surpreendente disposição governamental em avançar na perigosa seara da desregulamentação dos direitos dos trabalhadores e dos aposentados.

Flexibilização da CLT: origem no ABC

A validade do famigerado “fator previdenciário” continua inabalável, com a manutenção dessa metodologia perversa de redução dos valores mensais pagos aos aposentados e pensionistas. A desoneração da folha de pagamentos deixou de ser uma experiência localizada em alguns poucos setores da economia e torna-se a cada instante mais generalizada, comprometendo perigosamente a base de financiamento de nosso sistema de previdência social. Finalmente, gostaria de chamar a atenção para um projeto em particular: o chamado “Acordo Coletivo de Trabalho com Propósito Específico”. O nome parece pomposo, mas o conteúdo é nitroglicerina pura: flexibilização dos direitos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho, a nossa CLT.


O que mais impressiona é que o Ante Projeto de Lei para a implementação de tal estratégia seja assinado por um conjunto de sindicatos de metalúrgicos do Estado de São Paulo, liderados pelo Sindicato do ABC e com o patrocínio explícito da CUT. O documento já foi protocolado oficialmente junto à Presidência da República e há quem pretenda iniciar rapidamente sua tramitação no âmbito do Congresso Nacional.


Há décadas que o empresariado e os representantes do capital têm buscado, de todas as formas, eliminar de nossa legislação as garantias mínimas de direitos dos trabalhadores, tais como 13º salário, férias remuneradas, FGTS, adicional de hora-extra, jornada de trabalho regulamentada, licença gestante, regras de saúde e segurança no trabalho, entre tantos outros itens. Tudo isso em nome de apagar a era Vargas da memória coletiva da Nação, com o intuito enganador de promover a redução do chamado “custo Brasil”. Todos esses direitos são garantidos, a duras penas, pela legislação trabalhista, capitaneada pela CLT. Por mais antigo que seja esse código, o fato é que ele ainda serve para assegurar direitos mínimos dos trabalhadores, a corda mais frágil numa sociedade que há muito tempo é marcada pela desigualdade e pela exploração dos despossuídos. Felizmente, a articulação do movimento sindical, dos setores progressistas da sociedade e das próprias entidades atuantes na área da justiça trabalhista sempre esteve atenta às iniciativas de mudanças retrógradas, em geral no sentido de retirar tais direitos.

Anteprojeto da CUT: risco de retrocesso

Um dos casos mais simbólicos e mais recentes foi justamente a tentativa de aprovação de um texto em 2001, durante o mandato do Presidente Fernando Henrique. A tristemente famosa Medida Provisória nº 5.483, que abria o caminho para a flexibilização total desses direitos, por meio de um sutil caminho - a farsa da chamada “negociação direta” entre empresas e sindicatos. Nessa época, há mais de 10 anos atrás, o PT, a CUT e demais entidades patrocinaram um amplo movimento que obrigou o governo a recuar e aquela tentativa de intervenção neoliberal no campo trabalhista acabou fracassando.


Quis a ironia da História que o movimento de quebra da espinha dorsal dos direitos dos assalariados voltasse à pauta política pelas mãos daqueles que haviam justamente combatido a tentativa de promover o retrocesso na legislação. A proposta é polêmica e tem recebido muitas críticas. O Procurador do Trabalho Rafael de Araújo Gomes elaborou um texto esclarecedor, bastante minucioso, em que analisa o histórico e as conseqüências do tal ante projeto. O risco das perdas a serem impostas ao movimento sindical superam em muito as eventuais vantagens localizadas, que independem de tal mudança na lei. Para esses setores ditos mais “modernos” do mundo industrial, as mudanças no texto da lei não são nem necessárias, pois elas já ocorrem na prática.


É importante frisar que o desejo de alteração nas regras da CLT atende aos interesses de uma parcela bastante reduzida da classe trabalhadora brasileira. O caso dos metalúrgicos do ABC é bem sintomático dessa postura. Trata-se de uma categoria mais bem organizada, trabalhando em grandes indústrias e com uma importante história de mobilização e de luta sindicais. A existência de comissões de fábricas e acordos negociados diretamente com as empresas é uma prática antiga. Como esses instrumentos contêm cláusulas mais avançadas do que as previstas na legislação trabalhista, favorecem a falsa sensação de que a CLT seria um empecilho às lutas dos assalariados. Nada mais enganoso.


Assim, o fato dessa pequena amostra do universo dos trabalhadores normalmente conseguir avanços nas suas negociações com os representantes do empresariado não permite uma generalização para o conjunto do movimento sindical. Muito pelo contrário. A previsão do Ante Projeto é que os acordos coletivos tenham validade jurídica plena e superior à CLT, mesmo em situações onde haja conflito jurídico com as disposições previstas no código trabalhista. Isso significa abrir uma perigosa brecha na legislação, que não necessariamente implica em melhorias para o conjunto dos assalariados. A história recente apresenta um caso sintomático. Em 1994 foi promovida uma alteração na legislação pela Lei 8949, com a intenção de favorecer e estimular a formação de cooperativas de mão de obra para setores como vigilância, limpeza, alimentação, transportes e outros. Feita a cunha e introduzida a exceção no texto da lei, as mudanças terminaram por reforçar a exploração da força de trabalho, com a “legalização” de situações que antes seriam consideradas irregulares e sujeitas a fiscalização e multa.


A estratégia foi imediata: grupos empresariais sentiram a chamada janela de oportunidade e constituíram cooperativas de fachada. Bingo! Os trabalhadores passaram a receber o carimbo de “cooperativados”, mas sem nenhum poder de decisão no interior da associação para a qual trabalham. As cooperativas têm seus “donos”, assim como as demais empresas. Mas podem descumprir um conjunto amplo de exigências trabalhistas, pois a mudança na lei permitiu tal excepcionalidade. Um verdadeiro tiro no pé do movimento sindical e nos direitos dos trabalhadores.

Manter a CLT e avançar nas demais conquistas

A intenção do Ante Projeto é louvável. No dizer da exposição que acompanha o documento:

“A idéia do projeto nasceu do desejo de estimular que o País adote a negociação coletiva como instrumento mais moderno para a solução dos conflitos pertinentes às relações de trabalho e à representação sindical no interior da fábrica, como condição fundamental à democratização das relações entre trabalhadores e empresas.”


No entanto, o equívoco é partir do pressuposto de que a maior parte dos trabalhadores em nosso País encontre-se em situação análoga ou similar ao grupo dos metalúrgicos do ABC. O caminho ainda é longo para que as outras categorias e nas regiões obtenham os avanços necessários nas relações trabalhistas. Trata-se de implantar e consolidar as comissões de fábrica ou comitês de empresa, buscando a negociação no local de trabalho. Porém, abrir a exceção com mudanças na CLT para a absoluta maioria ainda desamparada, em nome de uma minoria já consolidada, representa um risco e uma irresponsabilidade injustificáveis.


Assim, é necessário que o conjunto dos atores políticos afetados por tal proposta de flexibilização dos direitos trabalhistas estejam atentos e vigilantes. A ressaca eleitoral oferece uma conjuntura em que as entidades e associações por vezes sentem-se anestesiadas pelo clima político geral e acabam deixando passar medidas que podem trazer conseqüências negativas para os próprios trabalhadores.

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Lanches são impostos como refeição obrigatória


Funcionários são proibidos de levar marmita e impedidos de deixar o local de trabalho no intervalo

08/10/2012

Michelle Amaral,
da Reportagem
McDonad´s obriga os funcionários a se alimentar somente com os lanches
de fabricação própria da rede - Foto: Reprodução

Um dos problemas apontados pelos trabalhadores do McDonald´s é o fornecimento exclusivo dos lanches produzidos pela rede de fast food para alimentação durante o período de trabalho. A conduta não é ilegal, já que as normas trabalhistas permitem que empresas forneçam alimentação a seus funcionários, estando liberadas da obrigação de conceder vale-refeição ou cesta básica.

Entretanto, o artigo 5º da Portaria Interministerial do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) nº 5/99 consagra o princípio da refeição saudável e variedade no cardápio do empregado. Ao invés disso, a ingestão diária de sanduíches, refrigerante e batata frita fabricados pelo McDonald´s têm causado sérios danos à saúde dos trabalhadores, como gastrites e obesidade.

É o caso de Patrício, de 17 anos, que trabalha há 1 ano e quatro meses no McDonald´s e têm sofrido com fortes dores no estômago, iniciadas após o ingresso na rede de fast food. “Ele não entrou lá doente. O meu filho ficou com gastrite por causa dos lanches”, conta Mauro Lúcio Lopes, pai do rapaz. Segundo ele, quando as dores começaram, o filho procurou a gerência para pedir autorização para levar marmita, mas foi informado de que a entrada de alimentos de fora nas instalações da loja era proibida, porque poderia causar a contaminação dos produtos do McDonald´s. Lopes afirma que o rapaz terá de deixar o emprego para preservar a saúde.

Bruna, que trabalha na rede de fast food desde 2010, ao ser orientada pelo médico a não consumir os lanches, devido à gravidez, também foi impedida de consumir alimentação própria na loja do McDonald´s, sob o mesmo argumento utilizado no caso de Patrício. “Disseram que se ela quisesse se alimentar, deveria comer a marmita na praça de alimentação do shopping onde trabalhava”, relata o advogado Fábio Lúcio Machado, que ingressou com ação judicial por dano moral contra a empresa.

Abuso

O Ministério Público do Trabalho de Pernambuco constatou que a proibição também está ocorrendo em lojas da rede de fast food no estado. A prática é uma das irregularidades denunciadas pelo MPT em ação civil pública contra a Arcos Dourados, franqueadora do McDonald´s no Brasil. “Ninguém pode ser proibido de levar para o ambiente de trabalho uma alimentação externa”, afirma o procurador do trabalho Leonardo Osório Mendonça. Segundo ele, o MPT também verificou que os funcionários são proibidos de sair das lojas durante o período de trabalho. “Se eles pudessem sair, teriam pelo menos a opção de comer em outro local, mas isso por si só não impediria que a empresa fosse obrigada a deixar os funcionários levar a alimentação de fora”, pondera. Outra irregularidade denunciada pelo MPT foi a concessão do período de intervalo no início ou no fim da jornada de trabalho. “Foi constatado na investigação que existiam situações do funcionário chegar para trabalhar às 10 da manhã e às 10h05 ele ter o direito ao intervalo intrajornada. Também chegou a acontecer o contrário, dele chegar para trabalhar às 10 da manhã e só parar para comer perto do final do horário de trabalho”, exemplifica o procurador, segundo o qual, seria razoável que o intervalo fosse concedido no meio da jornada de trabalho.

Essa não é a primeira ação movida contra o McDonald´s por questões relacionadas à alimentação dos funcionários. Em agosto deste ano, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) condenou uma loja da rede de fast food de Ribeirão Preto (SP) ao pagamento do valor correspondente a uma cesta básica por cada mês trabalhado por uma ex-funcionária. Já em maio, o tribunal condenou uma unidade do McDonald´s de São Bernardo do Campo (SP) a substituir por vale-refeição de R$ 7,80 ao dia o lanche oferecido como refeição a um ex-funcionário.

Anteriormente, em 2010, o McDonald´s foi condenado pela Justiça do Rio Grande do Sul a indenizar em R$ 30 mil um ex-gerente que, após trabalhar 12 anos na rede de fast food, engordou 30 quilos. E em 2009, o restaurante foi condenado a pagar ao ex-funcionário Rafael Luiz uma indenização de R$ 2 mil, correspondentes ao valor de cestas básicas durante cerca de dois anos – período em que ele trabalhou no local.

De acordo com o Sindicato dos Trabalhadores em Fast Food do Município de São Paulo (Sindifast), em reunião com a diretoria do McDonald´s, no último dia 22 de agosto, a empresa sinalizou a intenção de mudar a forma de alimentação de seus funcionários.

McDonald´s: quando o primeiro emprego se torna armadilha para jovens


Rede de restaurantes usa da pouca maturidade e fragilidade da juventude para usurpar direitos trabalhistas básicos

08/10/2012

Michelle Amaral,
da Reportagem
Atraídos, jovens são presas fáceis para as irregularidades trabalhistas
da rede de lanchonetes - Foto: Michelle Amaral


Atraídos pela chance do primeiro emprego, milhares de jovens brasileiros procuram a rede de restaurantes fast food McDonald´s para trabalhar. Eles buscam a oportunidade de iniciar a vida profissional e conquistar independência financeira. No entanto, pela pouca maturidade e falta de experiência, esses jovens se veem submetidos a condições irregulares de trabalho e têm usurpados seus direitos básicos.
“O McDonald´s tem essa imagem do primeiro emprego, [na contratação] eles passam uma coisa totalmente diferente do que é”, afirma Tatiana, que ingressou na rede de fast food com 16 anos e lá viveu uma das piores experiências de sua vida, que lhe traz consequências até hoje.

Aos 18 anos, Tatiana escorregou no refrigerante que havia escorrido de uma lixeira quebrada, caiu e sofreu uma séria lesão no joelho. Com fortes dores, a jovem foi levada para o gerente da loja. “Ele falou: ‘passa um Gelol e põe uma faixinha que sara’”, relata. Era final de ano, o restaurante estava lotado e Tatiana foi orientada a continuar trabalhando até o final do expediente. Após dois dias, sem conseguir andar, Tatiana procurou o médico, que diagnosticou o rompimento da rótula de seu joelho direito e indicou a necessidade de uma cirurgia. Segundo ela, ao procurar o McDonald´s para informar as consequências da queda, nada foi feito pela empresa que, inclusive, se negou a emitir um Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT). “Eu fui ao INSS e perguntei como podia fazer esse CAT. Me deram o papel e mandaram eu ir até o McDonald´s”, conta a jovem, que afirma ter sido orientada pelo gerente a não informar a data correta do acidente para que não resultasse em multa para a loja. Ela ainda denuncia que a gerência sabia do defeito na lixeira, mas não a consertou para evitar gastos, resultando em seu acidente.

De lá para cá, a trabalhadora viveu sob intenso tratamento médico e teve que procurar reabilitação profissional por meios próprios, já que não podia exercer as mesmas funções e o McDonald´s se recusou a adaptá-la em outra área da empresa. Ela se formou em Direito e realizou estágio em um escritório de advocacia. Com isso, após 11 anos do acidente, Tatiana conseguiu a carta que a declara ser pessoa portadora de deficiência física e dá o reconhecimento de sua reabilitação pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).

Tatiana passou por três cirurgias e anda com o
auxílio de uma muleta - Foto: Michelle Amaral
Hoje, aos 34 anos, Tatiana anda com o auxílio de uma muleta. Já passou por três cirurgias e necessita, ainda, realizar mais uma. No entanto, em março deste ano, ao tentar passar por uma consulta médica para agendar o procedimento, a trabalhadora foi informada do cancelamento de seu plano de saúde. O motivo foi a conclusão em janeiro da rescisão indireta do McDonald´s, solicitada pela trabalhadora em 2009. “O McDonald´s deveria ter comunicado ela [sobre o cancelamento da assistência médica], porque a lei diz isso, mas não comunicou, simplesmente cancelou”, protesta Patrícia Fratelli, advogada da trabalhadora. De acordo com a Lei nº 9.656 de 1998, regulamentada pela Resolução Normativa nº 279 da Agência Nacional de Saúde (ANS), no caso de rescisão do vínculo empregatício é assegurado ao trabalhador “o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral”. “Eu tinha condição de pagar o meu convênio, o McDonald´s tinha que ter me dado essa opção, porque agora perdi a carência e nenhum convênio vai me aceitar”, desabafa Tatiana, que há quase 16 anos enfrenta uma batalha judicial contra o McDonald´s para ter seu dano reparado.

Armadilha

O caso de Tatiana não é isolado. Tramitam na Justiça do Trabalho na cidade de São Paulo e região metropolitana 1.790 ações contra o McDonald´s e a Arcos Dourados Comércio de Alimentos Ltda., franqueadora master da multinacional no Brasil e na América Latina. Somente na capital paulista são 1.133 demandas judiciais ativas por conta das irregularidades trabalhistas e o tratamento inadequado dado pela empresa aos seus funcionários, conforme levantamento feito junto ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região. Entre as falhas cometidas pelo McDonald´s estão o pagamento de remunerações abaixo do salário mínimo, utilização de jornada de trabalho ilegal, falta de comunicação dos acidentes de trabalho, fornecimento de alimentação inadequada, não concessão de intervalo intrajornada, ausência de condições mínimas de conforto para os trabalhadores, prolongamento da jornada de trabalho além do permitido por lei, assédio moral e sexual. Além disso, existem denúncias de jovens que trabalharam sem serem remunerados (leia matéria na página ao lado).

No Brasil, o McDonald´s emprega hoje 48 mil funcionários, de acordo com informações publicadas em seu site. Destes, 67% têm menos de 21 anos e 89% tiveram na rede de fast food a primeira oportunidade de emprego formal. Questionado pela reportagem sobre os processos movidos contra ele, o McDonald´s disse que “não comenta processos sub judice”.

Para Rodrigo Rodrigues, advogado do Sindicato dos Empregados em Hospedagem e Gastronomia de São Paulo e Região (Sinthoresp), a oferta do primeiro emprego a esses jovens é pensada pelo McDonald´s a fim criar nesses trabalhadores o sentimento de submissão incondicional, em que o contratado acata tudo o que lhe é imposto, pela gratidão da oportunidade de trabalho. “A pessoa fica com receio de se indispor contra o tratamento que é dado na empresa. Isso é sutilmente pensado para que se chegue a essas finalidades”, alega.

A mesma avaliação é feita pelo procurador Rafael Dias Marques, coordenador nacional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho (MPT). Segundo ele, a necessidade do primeiro emprego e a vontade de começar a vida profissional são vistas por alguns empregadores como uma possibilidade de fraudar direitos que são garantidos a esses trabalhadores por lei. “Muitas empresas preferem contratar os mais jovens para evitar problemas trabalhistas, para torná-los uma massa de manobra mais fácil para executar [o trabalho] sem direitos trabalhistas, sem qualquer questionamento ou um questionamento mais brando”, afirma.


O procurador explica, ainda, que a pouca maturidade torna a contratação desses jovens vantajosa para essas empresas. “São pessoas que, por ainda serem jovens, não tem o senso crítico do questionamento e de resistir a determinadas situações de lesões de direitos”, analisa.

Garantia de direitos

O advogado do Sinthoresp lembra que o jovem tem que ser visto como um ser em transformação, que necessita de cuidados que lhe assegurem uma boa formação para a vida. “O trabalho é uma condição necessária, mas deve ser implementado aos poucos, não pode ser do jeito que está, coloca o jovem lá e vamos ver o que vai dar”, pondera Rodrigues. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) permite a contratação de adolescentes a partir de 14 anos, na condição de aprendiz, e de 16 anos para o trabalho normal. No entanto, o estatuto estabelece que a eles deve ser observado “o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”.

Desta forma, Marques ressalta que a atividade profissional não pode ser prejudicial ao desenvolvimento físico e social destes adolescentes e jovens, seguindo o que estabelece o Decreto nº 6.481/2008. “Eles são pessoas peculiares em desenvolvimento, em fase de formação, por isso que o trabalho nessa fase da vida tem que ser diferenciado”, analisa.
Empresa utiliza pouca maturidade dos jovens para negligenciar direitos
trabalhistas básicos - Foto: Michelle Amaral

O procurador alerta que, se não observados os cuidados com esses jovens, o trabalho pode lhes causar danos irreversíveis para a vida adulta. “O risco de lesão à saúde por uma situação do trabalho é muito mais evidente nessa parte da população, porque ainda que está em formação biológica”, observa. Segundo ele, “uma doença do trabalho nessa fase da vida é mais suscetível a ter continuidade, inclusive de levar ao quadro da invalidez”.

Foi o que aconteceu com Tatiana. Com o acidente ocasionado por uma negligência da empresa, teve sua vida completamente mudada. “ Tive que parar a minha vida. Fiquei um tempo sem estudar. Queria fazer enfermagem e o médico falou que eu nunca poderia ser enfermeira, porque não podia ficar em pé”, conta.
Rede de restaurantes fast food usa da pouca maturidade e fragilidade da juventude para usurpar direitos trabalhistas básicos

domingo, 7 de outubro de 2012

Passa mais uma eleição; a exploração e a luta de classes continuam!


Ivan Pinheiro

Hoje é um dia que a mídia hegemônica euforicamente saudará  como uma “festa da democracia”, mais um espetáculo para iludir o povo com a impressão de que ele decide o seu destino, escolhendo representantes.

Os opressores, que fazem política cotidianamente, valorizam as eleições para passar aos oprimidos a impressão de que política é poder votar livremente num candidato, na maioria das vezes um opressor! Daqui a dois anos, chegará novamente a “hora da política”.

Este teatro - farsa, drama e comédia - não tem nada de democrático. Democracia é igualdade de condições para se travar qualquer disputa. A desigualdade está nas fortunas gastas nas campanhas, no financiamento de empresas, na corrupção, na manipulação midiática, na maquiagem demagógica de candidatos.

Os verdadeiros temas políticos e ideológicos são colocados em segundo plano, imperando a demagogia e o debate técnico sobre como resolver problemas em geral insolúveis no capitalismo.

Mas os comunistas não renunciam a lutar em qualquer terreno. Mesmo conhecendo suas desvantagens, enfrentam a burguesia em seu próprio campo, desmascarando-a, denunciando o sistema político, econômico e social.

O PCB mais uma vez enfrentou este desafio; mais uma vez, milhares de verdadeiros militantes comunistas foram às ruas, aos bairros, às escolas e aos trabalhadores, levando a mensagem do socialismo, denunciando o capitalismo, o imperialismo.

Os nossos resultados políticos foram positivos; os resultados eleitorais serão modestos, pois o PCB se recusa a participar de coligações com partidos da ordem, que poderiam nos assegurar mandatos, mas que custariam caro à nossa coerência política, ao nosso projeto de ruptura com o capital.

O PCB avançou também em seu processo de reconstrução revolucionária. Nas eleições burguesas os militantes se revelam, para o bem ou para o mal. A regra foi a militância aguerrida, a disciplina consciente, a defesa da linha política do Partido. As direções do PCB não vacilaram em anular coligações espúrias, retirar candidaturas, dissolver instâncias partidárias, expulsar os que se degeneraram. O Partido sai depurado dessas eleições.

Assim mesmo, contra a nossa vontade, ainda disputarão essas eleições alguns candidatos que, apesar de impugnados e expulsos pelo PCB, conseguiram manter a candidatura por força de decisões judiciais. Não são candidatos do PCB, mas de juízes e grupos oligárquicos locais. São produtos residuais de filiações indiscriminadas feitas antes de nossa decisão de só admitir militantes (e não apenas filiados) por recrutamento (e não por filiação). Servem de lição para redobrarmos nossa vigilância revolucionária.
Mas as eleições passam e a luta continua. Não será através delas que construiremos o socialismo, nem diminuiremos a exploração capitalista.

Vêm aí o Congresso da Unidade Classista, as lutas contra as reformas regressivas dos direitos trabalhistas e previdenciários, o trabalho entre a juventude, as mulheres, os trabalhadores e o proletariado em geral; vem aí o cotidiano da luta de classes, o exercício do internacionalismo proletário, a construção do Partido, os debates do XV Congresso.

E não podemos deixar de nos dirigir aos aliados da Frente de Esquerda, com os quais lutamos nesta batalha eleitoral. Não queremos mais meras coligações eleitorais. O PCB espera que a generosa demonstração de unidade que deu nessas eleições contribua para a construção de uma frente permanente, para a luta cotidiana contra o capital e o imperialismo, na perspectiva do socialismo.

Ivan Pinheiro

Secretário Geral do PCB


terça-feira, 2 de outubro de 2012

UJC Participa Ativamente da Greve das IFES


UJC

Após quatro meses de greve, professores, técnicos administrativos em educação e estudantes se preparam para voltar às suas atividades, não sem a certeza que uma dura realidade os aguarda e das difíceis lutas que ainda estão por vir.

Durante todo este tempo, a União da Juventude Comunista (UJC) apoiou e participou da construção desse movimento nacional de greve, construindo cotidianamente a greve junto às demais categorias nas universidades onde está organizada, assim como compondo os comandos locais e nacional de greve.

A desestruturação da carreira docente, as péssimas condições de trabalho a que estão submetidos professores e servidores, o aumento das terceirizações, assim como salas de aulas lotadas, falta de professores, parca assistência estudantil, ausência de restaurantes universitários e instalações precárias figuram entre os principais problemas enfrentados no cotidiano de todos aqueles que passam pela universidade e foram umas das principais reivindicações do movimento.

A precarização da educação brasileira não deve ser entendida somente como um problema de ordem administrativa ou de financiamento, mas algo que vai muito além. O sucateamento da educação pode ser traduzido numa concepção de Estado que há anos vem sendo implantado no Brasil, que preza por uma lógica de mercado e por parcerias com empresas privadas, colocando nitidamente a Universidade sob interesses privados.

Se voltarmos nossas memórias alguns anos atrás, poderemos nos lembrar de uma série de reformas universitárias no período FHC que expandia as instituições privadas e controlava as verbas públicas para o ensino superior. Tal política, aprofundada, sobretudo, no governo Lula com programas de transferência de verba pública para as instituições privadas, como o FIES e o Prouni, hoje levam a um panorama onde 76,6% dos estudantes do ensino superior estão na rede privada, enquanto apenas 23,4% estão em universidades públicas que estão cada vez mais sucateadas.

Se há alguns anos já se delineava um nítido processo de favorecimento ao capital privado na expansão do ensino particular, nos últimos anos esses interesses penetraram sem nenhum pudor na rede pública. Seja através da terceirização de grande parte de seus serviços, da existência de fundações privadas que buscam captar verbas na iniciativa privada ou de privatizações dos HU’s através das Empresas Brasileiras de Serviços Hospitalares (EBSERH), o fato é que a Universidade pública se transformou no mais novo balcão de negócios do país.

Além desse processo de sucateamento e privatizações, a Universidade pública se mostra, de uma vez por todas, como um centro de reprodução do saber, da formação profissional e da ideologia dominante. O que em tese deveria ser um espaço para a formação do senso crítico e para a produção de um conhecimento voltado para a classe trabalhadora, mais do que nunca, vem funcionando de acordo com interesses privados; caso contrário, como justificar que certos cursos de agronomia servindo diretamente às empresas de agronegócios em um país onde reina a concentração de terras? Como explicar projetos de extensão que se colocam ao dispor de grandes empresas, perdendo assim o caráter de extensão? Ou então, como justificar cursos de arquitetura onde a maior preocupação seja elaborar projetos de shoppings centers e prédios de luxos, enquanto grande parte da população sequer tem um teto para morar?

Tendo em vista essas reflexões, a União da Juventude Comunista não tem a ilusão de alterar esses problemas da Universidade sem superar por completo a inserção das relações sociais e produtivas próprias da ordem social em que vivemos e que são base de um número sem fim de problemas que afetam a educação brasileira e seu caráter.

Isso significa que não devemos nos restringir a uma luta reativa ou a simples defesa de uma educação pública, gratuita e de qualidade, mas, sobretudo, de uma educação popular. Significa também que devemos apoiar e ir além de uma simples luta pelos 10% do PIB para educação pública, já!, afinal, de que valeria um aumento de investimentos nesse modelo de universidade senão para aprofundar esse sistema pautado pela lógica do mercado?

Ao mesmo tempo em que a greve ganhava apoio e adesão em todas as Universidades, o governo fechava os olhos para os problemas reais, ora negando o diálogo com os setores em greve, ora apresentando uma proposta rebaixada aos professores. Com os estudantes o governo tomou a mesma atitude intransigente, negando receber o Comando Nacional de Greve dos Estudantes (CNGE), composto por delegadas e delegados tirados em assembléias nas universidades, optando, ao invés disso, em falar diretamente com a UNE (que não apoiou, na prática, as greves), num claro sentido de desmobilizar o movimento grevista.

Ainda que a maior parte das reivindicações dos setores em greve não tenha sido atendida, o movimento de greve tem a potencialidade de alçar ganhos políticos e organizativos para além das demandas mais imediatistas, o que sem dúvida será o nosso maior desafio a partir de agora. O enfraquecimento do PROIFES e o fortalecimento do ANDES, assim como de suas seções locais, já são um exemplo desses ganhos.

No movimento estudantil, acreditamos que este ganho só será dado se o mesmo for referendado através de suas bases e não ter como porta-vozes entidades atreladas à ordem que servem como correia de transmissão dos interesses do governo às Universidades, mas sim por um movimento que esteja pautado na real demanda dos estudantes e trabalhadores e disposto a lutar lado a lado aos movimentos sociais combativos, formulando um novo projeto. Em outras palavras, devemos, de uma vez por todas, debater coletivamente um projeto de universidade que esteja balizado nas demandas concretas dos trabalhadores e que contribua para um processo mais amplo de transformação social; desta forma, levantamos a bandeira da UNIVERSIDADE POPULAR.

Sabemos que esse caminho não será curto nem fácil, mas vislumbramos na greve uma excelente oportunidade para o iniciarmos. Isso significa que em todos os espaços de luta devemos criar mediações que tensionem contra a lógica de mercado nas universidades, seja contra as fundações privadas; pelo aumento das verbas governamentais para a assistência estudantil; pela luta por uma Universidade verdadeiramente democrática, não somente em suas instituições internas, mas, sobretudo, na produção de conhecimento; contra o convênio com empresas privadas e na luta pela reestruturação do plano de carreira para os docentes.

Para tanto, esperamos construir junto a todos os setores e organizações, um calendário unificado de lutas para os próximos períodos na perspectiva de lutar por uma Universidade pública, gratuita, democrática, de alta qualidade e popular!

COORDENAÇÃO NACIONAL DA UJC

OUTUBRO DE 2012

http://ujc.org.br/?p=373

NÃO AOS LEILÕES DE PETRÓLEO


Emanuel Cancella*

Os brasileiros já conviveram com a escravidão; com a proibição do voto feminino; com a ditadura militar; com o racismo; com a homofobia; com o machismo. Grande parte desses absurdos foi superada e outra parte foi inibida pela lei. Mas a superação do atraso só aconteceu depois de muita mobilização e luta!

O maior movimento cívico brasileiro foi “O petróleo é nosso!” Esse movimento, que tomou o Brasil de norte a sul e de leste a oeste, nas décadas de 1940-50, uniu comunistas e conservadores, militares e civis. Um dos principais líderes do movimento do petróleo foi Monteiro Lobato, paulista da cidade de Taubaté, um fazendeiro que se transformou em escritor, aliás, o principal autor brasileiro de obras infantis e um dos maiores no mundo. Chegou a ser preso, na sua luta para provar que havia petróleo no Brasil.
Lobato escreveu “O escândalo do petróleo”. Nesse livro, o escritor se posiciona totalmente favorável à exploração do petróleo apenas por empresas brasileiras.

Maria Augusta Tibiriçá Miranda, médica, também uma das líderes desse movimento cívico, hoje com mais de 90 anos, escreveu um livro cujo título tem o nome da memorável campanha “O Petróleo é Nosso!”. Tibiriçá já profetizava que “a luta pelo petróleo brasileiro não terminaria nunca”.

Precisamente agora, estamos em meio a mais uma batalha dessa infindável guerra que já resultou em centenas de perseguições, prisões, mortes.  Inclusive  o suicídio do presidente Vargas teve como pano de fundo a questão do petróleo. Em seu governo, Getúlio criou a Petrobrás e instituiu o monopólio estatal do petróleo.

Quando o petróleo era um sonho, fomos protagonistas de uma das páginas mais emocionantes e marcantes de nossa história: a campanha O Petróleo é Nosso. Como poderíamos imaginar que, depois de tudo isso, no momento em que o petróleo brasileiro se torna realidade, há quem ouse defender  os leilões! Leiloar o nosso petróleo é o mesmo que vender um bilhete premiado.

Como disse, também, o brilhante ator Paulo Betti, referindo-se ao pré-sal,  no filme “O Petróleo é Nosso – A Última Fronteira”: “...é como se  encontrássemos um tesouro valiosíssimo em nosso quintal e, então, entregássemos a outros, porque somos incompetentes para administrá-lo!”

Por mais de trinta anos, a Petrobrás vem gastando bilhões de reais para descobrir o pré-sal, inclusive desenvolvendo tecnologia inédita no mundo. Se investimos e acumulamos conhecimento nessa tecnologia, como justificar a defesa dos leilões, para que estrangeiros explorem e se apossem das nossas reservas de petróleo?

O pior é que, por trás das multinacionais de petróleo, as mesmas que foram contra a criação da Petrobrás e do monopólio e agora defendem com tanto ardor os leilões, está a conivência de boa parte da mídia, a presidente da Petrobrás, Graça Fortes, o IBP e a Firjan. Cedendo as pressões, o governo brasileiro já anunciou a retomada dos leilões para maio e novembro do próximo ano.

Valeu Monteiro Lobato, Maria Augusta Tibiriçá e Getúlio Vargas, por lutarem e se posicionarem a favor dos interesses do povo brasileiro. Mas, infelizmente, a julgar pelos rumos que esse debate vem tomando, tende a prevalecer a frase cinicamente pronunciada pelo primeiro diretor geral da Agência Nacional de Petróleo – ANP. Em seu discurso de posse, David Zilberstein, ex-genro de FHC, falando à imprensa e a representantes das multinacionais, declarou: “O petróleo é vosso!”
Emanuel Cancella é secretário-geral do Sindicato dos Petroleiros do Estado do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ)
http://www.apn.org.br/w3/index.php/opiniao/5003-nao-aos-leiloes-de-petroleo

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Cidades privadas em Honduras: e se essa moda pega?


Na prática, o governo está entregando estas áreas para empresas transnacionais estrangeiras que nelas deverão construir “cidades modelo”
13/09/2012

Raquel Rolnik

Na semana passada, o governo de Honduras assinou um acordo com uma empresa dos EUA para iniciar a construção das chamadas Regiões Especiais de Desenvolvimento. Na prática, o governo está entregando estas áreas para empresas transnacionais estrangeiras que nelas deverão construir “cidades modelo”, ou “charter cities”.

Trata-se de áreas “recortadas” do espaço institucional e político do país, convertidas em uma espécie de território autônomo — com economia, leis e governo próprios — totalmente implementado e gerido por corporações privadas. Idealizado por um pesquisador norte-americano, este modelo de cidade foi recusado por muitos países, inclusive pelo Brasil — Ufa! — antes de ser aceito em Honduras, através de uma mudança da Constituição aprovada em janeiro deste ano.

Organizações da sociedade civil, incluindo grupos indígenas cujos territórios podem estar inseridos nas zonas “liberadas”, vêm criticando o projeto, que consideram catastrófico, e já acionaram a Suprema Corte de Honduras, alegando inconstitucionalidade.

Versão extrema de um liberalismo anti-Estado e pró-mercado, o fato é que este modelo, na verdade, exacerba uma lógica privatista de organização da cidade, já presente em várias partes do Brasil e do mundo, como é o caso dos condomínios fechados, das leis de exceção vigentes sobre áreas onde se realizam megaeventos esportivos, dos modelos de concessões urbanísticas, entre outros exemplos possíveis.

A ilusão de uma sociedade sem Estado, teoricamente livre da burocracia, da corrupção e do abuso de poder, é na verdade a ditadura do consumo e do poder absoluto do lucro sobre a vida dos cidadãos. Imagina se essa moda pega…

Raquel é urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e relatora especial da Organização das Nações Unidas para o direito à moradia adequada. 
(Texto publicado originalmente no Yahoo! Colunistas)

domingo, 16 de setembro de 2012

SÓ UMA FRENTE CLASSISTA UNITÁRIA SERÁ CAPAZ DE BARRAR A NOVA OFENSIVA CONTRA OS DIREITOS TRABALHISTAS


(Nota Política do PCB)

“O princípio básico para a modernização das relações trabalhistas está na livre convergência de interesses, como forma de resolver os conflitos, ao invés de submetê-los à tutela do estado”. (Fernando Henrique Cardoso)

“Os novos líderes metalúrgicos do ABC substituíram o confrontacionismo por atitudes cooperativas e relações de parceria”. (editorial de O Estado de São Paulo)

“A lei tolhe a autonomia de trabalhadores e empresários, impondo uma tutela do estado, um barreira para um equilíbrio mais consistente; onde há controle excessivo e regras engessadas, a liberdade morre”. (Sindicato dos Metalúrgicos do ABC)

“A legislação impede os empresários de resolver problemas que a competitividade moderna impõe”. (Sérgio Nobre, Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC)

Anuncia-se para logo após as eleições municipais deste ano a apresentação ao Congresso Nacional de mais um projeto de “flexibilização” dos direitos trabalhistas, o que significa flexibilizar para baixo, pois para cima não há necessidade de alterar qualquer lei; as leis trabalhistas no Brasil estabelecem patamares mínimos de direitos. Se um acordo coletivo prevê adicional de horas extras superior ao patamar mínimo de 50%, ele é legal; caso o percentual seja abaixo deste patamar, ele é nulo de pleno direito. Da mesma forma, as férias remuneradas não podem ser inferiores a trinta dias e assim em diante.

A novidade leva o título de “Acordo Coletivo de Trabalho com Propósito Específico” (ACE), que tenta consagrar o velho sonho de consumo dos empresários, no sentido de que “o acordado prevaleça sobre o legislado”, como se houvesse “livre negociação” entre a forca e o enforcado.

O risco de este projeto ser aprovado é muito maior do que os anteriores. O projeto apresentado por FHC em 2001 foi detonado pelo PT e pela CUT, então na oposição e ainda não totalmente degenerados. O projeto apresentado por Lula em 2005, sob o título de “reforma sindical”, foi por ele retirado no ano seguinte, para não perder o apoio dos trabalhadores à sua reeleição, diante da resistência do sindicalismo classista e até de setores da própria CUT. Mas Lula fatiou o seu projeto e no segundo mandato conseguiu implantar alguns de seus objetivos, como o fim da garantia de manutenção de direitos através do dissídio coletivo e a institucionalização e cooptação das centrais sindicais, atribuindo-lhes recursos do imposto sindical. Ao invés da redução da jornada de trabalho e do fim das horas extras, generaliza-se o Banco de Horas, que amplia a jornada de trabalho sem remuneração. No lugar do aumento real de salários, prevalece a Participação nos Lucros, que não incide sobre as verbas salariais, é isenta de encargos sociais e não se incorpora aos salários.

Caso aprovado este projeto, os acordos coletivos por empresas terão plena garantia jurídica para a flexibilização de direitos para baixo, impedindo qualquer contestação judicial.

Com duração de até três anos e prevalecendo sobre convenções coletivas, a generalização destes acordos específicos poderá inviabilizar campanhas salariais unificadas nas datas-bases, greves gerais por categorias e ramos de produção e, o que é mais preocupante, esmorecer o espírito de classe entre os trabalhadores. Será o melhor dos mundos para o capital levar a efeito seu projeto de “interiorização dos conflitos na empresa”, local mais favorável para pressões sobre os trabalhadores.

Outro objetivo do projeto é a implantação no Brasil do modelo norte-americano de sindicato por empresa, propício à conciliação de classe, para fazer com que os trabalhadores “vistam a camisa da empresa”, sentindo-se seus parceiros, colaboradores. É o modelo oposto ao do sindicato por ramo de produção, defendido pelas correntes classistas, que estimula a unidade na luta e a consciência de classe.

O projeto em verdade legitima o sindicalismo por empresa que já vem sendo praticado há mais de vinte anos pelos metalúrgicos do ABC, disfarçado sob o nome de Comissão de Empresa, um instrumento de conciliação de classe dirigido pelo setor de RH das empresas em parceria com os burocratas sindicais, na lógica de ajudar a alavancar os lucros das empresas para garantir os empregos do “público alvo” cativo do sindicato, mesmo à custa de perda de direitos. O sindicato se transforma num cartório de registro de acordos específicos, como depositário e fiador deles

As citações com que abrimos esta nota revelam o quanto esta tentativa de “flexibilizar” para baixo direitos trabalhistas é muito mais perigosa que as anteriores. Ela será apresentada como uma espécie de pacto social, tripartite, acima das classes, um consenso entre a CUT e as outras centrais pelegas, a CNI e todas as lideranças empresariais, o PT e o PSDB, o governo e a oposição burguesa.

E para procurar iludir os trabalhadores, o projeto de lei será apresentado pela CUT (hoje um aparelho do PT a serviço do governo), pelo simbólico Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, com o aval de Lula, e por umMinistro do Trabalho que ostenta o sobrenome Brizola, identificado com o trabalhismo.

Chamamos atenção para o fato de que o projeto terá que tramitar num Congresso Nacional hegemonizado amplamente por representantes do capital. À semelhança do que aconteceu com o Código Florestal, a emenda será pior que o soneto.

Este projeto é o ponto alto dos recentes ataques do governo aos trabalhadores, já materializados na desoneração generalizada da folha de pagamentos na indústria, no projeto de nova contra-reforma da previdência e na correria para aprovar a lei da greve no serviço público, medidas que contam com o apoio explícito ou o silêncio cúmplice das centrais sindicais oficiais, correias de transmissão do capital entre os trabalhadores.

Conclamamos todas as forças políticas e movimentos sindicais e populares antagônicos ao capital a juntos forjarmos uma combativa unidade de ação na luta em defesa dos direitos trabalhistas, analisando a possibilidade da convocação de um grande evento nacional para marcar a resistência dos trabalhadores a este projeto, cujos objetivos  são promover a conciliação de classe, reduzir direitos e fazer avançar ocapitalismo brasileiro, aprofundando ainda mais a exploração sobre a classe trabalhadora.

PCB – Partido Comunista Brasileiro

Comitê Central

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O direito de greve é de todos os trabalhadores. Não à repressão!


(Nota Política do PCB)

O Governo deverá enviar ao Congresso, provavelmente ainda no mês de outubro, um projeto para “regulamentar” o direito de greve dos servidores públicos. Entre as principais motivações alegadas, estão a necessidade de garantia das chamadas “atividades essenciais” (que não poderiam ser paralisadas, em nenhuma condição) e a restrição às “operações – padrão” em que os servidores exercem as atividades rigorosamente conforme as determinações exigidas, sem deixar de fazer nenhum procedimento previsto e fazendo a divulgação, para o público, de suas reivindicações. A versão inicial, anunciada  pelo governo, fala em exigência de manutenção de atividades na ordem de 50 a 80%, dependendo do setor, entre outras restrições em caso de greve.

Com apoio da grande mídia, o governo e as representações da burguesia combatem ferozmente as greves de servidores, seja com a omissão de sua existência nos noticiários, seja com a ampla divulgação dos “transtornos” causados pelos movimentos, como os engarrafamentos nas estradas, as filas nos aeroportos os alunos sem aulas. A mídia fala muito, também, dos “altos salários” (inexistentes, na grande maioria das carreiras) e dos “privilégios” dos servidores, como o instituto da estabilidade.

O Governo envia este projeto num momento em que muitas greves vêm sendo deflagradas no serviço público: professores e servidores técnico-administrativos das universidades e institutos tecnológicos federais, policiais rodoviários, policiais federais e outras categorias entraram massivamente em greve, após muitos meses de tentativas frustradas de negociar reajustes salariais para fazer frente às perdas geradas pela inflação dos últimos anos e para a reestruturação das respectivas carreiras.

Com o alastramento do movimento por um número cada vez maior de categorias, nem mesmo os sindicatos e as centrais sindicais que haviam sido cooptadas pelo bloco de poder burguês instalado no Brasil – com a oferta de cargos diversos e outras benesses  para as suas lideranças – conseguiram conter a insatisfação de suas bases. O governo, mesmo abrindo alguns processos de negociação, lançou mão de ameaças de corte de ponto e de diversos outros tipos de intimidação. É bom lembrar que a negociação sobre a reposição dos dias parados é parte de qualquer processo de enfrentamento entre trabalhadores e patrões, estes, no caso em questão, representados pelo Estado. Os professores das universidades federais que saíram  da greve reporão as aulas não dadas ao longo da paralisação.

A esse enfrentamento com os servidores, somam-se, para o governo, desgastes como o baixo crescimento da economia, o baixo desempenho eleitoral do PT e dos demais partidos aliados, os efeitos do desmonte da saúde e da previdência públicas, das péssimas condições de vida, dos empregos precarizados e mal-remunerados que formam, hoje, o quadro dominante para a maioria dos trabalhadores.

O direito de sindicalização dos servidores públicos foi conquistado na constituição de 1988, assim como o direito à greve. Foi uma conquista importante, possibilitada pelo acúmulo de forças das grandes mobilizações e lutas que, forjadas no enfrentamento da ditadura, da carestia e das precárias condições de vida e trabalho que predominavam para a maioria dos trabalhadores, culminaram em conquistas importantes para a maioria da população brasileira no texto constitucional aprovado na Assembléia Constituinte (esta própria um resultado da luta popular). A Organização Internacional do Trabalho, em sua Convenção 151, ratificada pelo Brasil, prevê a negociação coletiva e a fixação de data base para as categorias de servidores públicos.

A estabilidade do corpo de funcionários que trabalham para o Estado foi instituída, há muito tempo, como uma garantia para o próprio Estado. É uma salvaguarda para que, com as trocas de governo, não se promova uma troca de pessoal por motivação político-partidária, para que esse corpo de trabalhadores, contratado após a realização de concursos públicos,  possa servir à população, levar até ela os serviços a que tem direito, e daí vem o nome de servidor.

Cercear o direito de greve dos servidores é uma ação que transcende o plano conjuntural, é parte de um projeto maior de dominação burguesa, que, dadas as condições em que o capitalismo opera hoje, precisa aumentar a taxa de exploração do trabalho para garantir sua sobrevivência. É um direito que vem sendo minado, na prática, pelos governos Collor, FHC, Lula e agora Dilma, com a terceirização de serviços do Estado, a redução de salários e a retirada da data-base para a negociação dos reajustes salariais do funcionalismo, feita sob a alegação de que era preciso “não realimentar a inflação”.

A luta de classes se dá em todas as esferas. No que diz respeito ao Estado e seu papel, é preciso não apenas resistir à destruição da parte do Estado que se volta para o atendimento das necessidades da maioria da população como também fortalecê-lo e transformá-lo, torná-lo cada vez mais passível de controle pelos trabalhadores até a sua transformação – como parte de uma luta maior contra o sistema capitalista – em outro Estado, um Estado da classe trabalhadora, um Estado socialista.

É preciso esclarecer a população que o prejuízo maior não é pela falta de aulas que ocorre durante as greves de professores ou de atendimento de saúde que ocorre durante as greves de profissionais de saúde, mas sim pela falta de escolas, de hospitais, de universidades para todos, com pessoal qualificado e bem pago, com alta qualidade. Defender o direito de greve dos servidores públicos é defender o direito da população lutar pelos seus direitos.

Nesse sentido, os movimentos de servidores devem buscar o diálogo com a população, buscar seu apoio militante, incorporar em suas ações a defesa da universalização do acesso à escola, à saúde, à previdência, à moradia, ao direito e à estabilidade de emprego. Devem somar forças com as categorias em luta no setor privado.

O Governo teme o poder dos movimentos de servidores por conta desse imenso potencial de luta e persuasão, que sempre exerceu, mesmo antes da conquista do direito de greve, em 1988. O momento exige mais ação de todos os servidores públicos, de toda a classe trabalhadora, para barrar essa nova ameaça ao direito fundamental de todos os trabalhadores de lutar por seus direitos.
Nenhum direito a menos!!!!
Comissão Política Nacional
Partido Comunista Brasileiro

AS CAÇADAS DE PEDRINHO À CAÇA DA LIBERDADE INTELECTUAL - CONTRA O OBSCURANTISMO PSEUDO-LIBERTADOR!


Antonio Carlos Mazzeo*

Não me estranha ler nas páginas dos jornais manifestações de xenofobia e racismo. Elas estão por toda parte, em todo o mundo. Ciganos na França e na Itália, árabes, romenos e polacos em toda a Europa, latinoamericanos e negros nos EUA, índios no Brasil central, negros e nordestinos no Brasil meridional, etc. Um velho fenômeno muito discutido, mas pouco apreendido em suas raízes fundantes. O ponto nevrálgico e "universal" dessa discriminação é que todas essas populações discriminadas tem como origem países ou regiões miseráveis. São os "Condenados da Terra", como diria Frantz Fanon, sem perspectivas, abandonados à própria sorte, estigmas vivos, membros permanentes da inclusão exclusora da ordem e da lógica do capitalismo.

Muitos intelectuais e ativistas de movimentos contra o racismo e a discriminação apontam como elemento central do problema duas questões correlatas: a cultura e a ideologia no que, em princípio, mas só em princípio, estamos de acordo. A dominação política (aqui em sentido ideo-cultural) sempre foi acompanhada por justificativas de superioridade, seja "racial", seja "cultural". Toda forma social hegemônica buscou legitimação afirmando-se como superior diante dos outros povos. Até seus deuses eram maiores e mais poderosos que o dos outros! Rá do Egito era superior à deusa Saushka (equivalente à deusa Ishtar mesopotâmica) dos Hititas. Joevá, o deus vingador dos judeus (e depois dos cristãos), superior ao panteon egípcio e romano, que fazia cair muralhas ao som das trombetas dos anjos. No capitalismo, as manifestações ideo-culturais ocidentais são apresentadas como "superiores" às outras, e assim por diante. Aliás, foi esse cientificismo positivista, típico da ideologia da sociedade capitalista, que justificou a assim chamada "teoria racial" dos finais do século XIX e do século XX.

Desde o ensaio de Gobineau, Essai sur l'inégalité des races humaines, de 1855, e dos escritos raciais do inglês Huston Chamberlain, com seu livro Os fundamentos do Século XIX (Die Grundlagen des Neunzehnten Jahrhunderts) de 1899, até o polêmico e racista livro de Herrstein e Murray, The Bell Curve (A Curva de Bell ), de 1994, todas as tentativas de "justificar" a desigualdade entre os seres humanos partiram de "bases" fundadas em aspectos raciais. A descoberta do DNA e a comprovação de que não há variações na composição genético-estrutural dos seres humanos, quer dizer, não existem raças humanas mas sim as manifestações fenotípicas", ou seja, meramente morfológicas, de aparência, não desestimulou os adeptos das "teorias das raças", como atesta o livro de Murray e Herrstein. Ali, obscuramente tenta-se comprovar que o isolamento de parte da espécie humana proporcionou, segundo os autores, o desenvolvimento qualitativamente diferenciado da "raça branca".

Numa entrevista à Folha de São Paulo (05/11/2007), um dos autores do livro, o cientista político Charles Murray assinala: “Pois a ciência está nos dizendo claramente nos últimos anos que, ainda que o ser humano tenha a mesma imensa maioria de genes, aquele número comparativamente pequeno que difere pode produzir diferenças muito grandes entre grupos. Quanto à probabilidade de ter certas doenças, por exemplo, como a Doença de Tay-Sachs nos judeus ou a anemia falciforme nos negros. Certamente afeta a aparência física e não há razão para pensar que não tenha havido pressões evolucionárias diferentes em relação à habilidade intelectual. Não sabemos ainda se é verdade, mas certamente não há nenhuma razão para pensar que não é verdade" (cit.). Mais adiante, Murray, justificando outro teórico racista estadunidense, o prêmio Nobel de fisiologia e medicina, James Watson - para quem os negros são inferiores aos brancos - , afirma que o erro de Watson foi declarar aos jornalistas que "quem tem que lidar com empregados negros sabe a diferença".(cit.)

A tal "prova" científica defendida pelos "três amigos" (Murray, Herrstein e Watson) é a capacidade intelectual diferenciada entre negros e brancos. Para tal, realizaram testes de quoeficiente intelectual (QI) aplicados em negros e brancos, e entre "tipos" diferenciados de brancos" (variante racial/de espécie?) como os judeus. Independente de ser essa uma abordagem meramente ideológica, ainda se quiséssemos buscar algum mérito científico nessas conclusões, perderíamos muito tempo para nada. Em primeiro lugar, é sabido que testes de QI tem por base um "tipo" de formação cultural e intelectual centrado numa universalidade cultural relativa, porque centrada nos países ocidentais ou de forte influência ocidentalizante. Dispersa e fragmentada em países periféricos e onde predominam etnias distanciadas do mundo ocidental. Em segundo lugar, e que se entrelaça com o primeiro argumento, há o fator social e de classe, porque o acesso à cultura é sempre dificultado aos segmentos proletarizados das sociedades contemporâneas. Isto é, esse tipo de teste pressupõe uma pessoa que possua formação integralmente articulada com os valores da sociabilidade capitalista em sua totalidade. Finalmente, essa avaliação ignora o fundamental da construção da sociabilidade humana, sua PRAXIS SOCIAL! É em sua praxis (o trabalho enquanto praxis humana) que o homem, como ser social, se objetiva e se diferencia de si e dos outros homens (como seres sociais ontológicos). Dai, as diferenças estão centradas em suas formas societais, nas formas de organização da vida. Os diferentes níveis de compreensão do mundo e de construção civilizatória criam as condições e os "graus" de sofisticação científica e tecnológica entre as formas de sociabilidade. Nunca o determinismo biológico!

Seguramente um indígena ou um negro não familiarizado com o universalismo burguês seria reprovado num teste como esse. Além do mais, as argumentações dos "três amigos" são recheadas de senso comum preconceituoso e isso elevado à condição de "ciência", ou melhor dizendo, de pseudo-ciência, torna-se arma perigosa para preconceitos e intolerâncias de todos os matizes. Para amenizar suas concepções racistas, e dentro de um racismo às avessas, Murray afirma que chegou à conclusão que os judeus possuem um quoeficiente intelectual acima da média humana, principalmente os asquenazes (judeus da Europa oriental). Esse tipo de afirmação plena de ideologismos, ignora processos históricos, a luta pela e contra a dominação e o "supremacismo" dos países dominantes, principalmente na fase imperialista do capitalismo. Se notarmos a última argumentação sobre os judeus asquenazes (que geraram intelectuais de grande expressão, como Freud, Einstein e Mahler, entre outros) veremos que ela está baseada numa pretensa "mutação genética", porque estes judeus miscigenaram-se com os brancos europeus!

Nada diferente do que propunha nosso mestiço racista de Saquarema Oliveira Viana, que já em seu Populações Meridionais do Brasil, de 1920, propunha a miscigenação para "aprimorar" e forjar uma "raça" brasileira e com isso, eliminar os aspectos "degenerados" presentes no negro e nos índios! Com informações de uma ciência genética incipiente, esse autor pregava uma sutil "limpeza" racial através da preponderância genética branca, isto é, a teoria eugênica do embranquecimento do brasileiro. O historiador Thomas Skidmore, em seu livro Preto no Branco, lembra da boa impressão que tal teoria causou em Theodore Roosevelt, futuro presidente estadunidense, em artigo publicado no jornal Correio da Manhã onde afirmava que o projeto era a eliminação total do negro, branqueando-o gradativamente através da miscigenação.

Ora, essa visão permeou todo o imaginário intelectual brasileiro, pelo menos até a segunda metade do século XX e vem permeando ainda hoje, mesmo que de forma mais "sofisticada" e dissimulada. Não é nenhuma novidade que nas forças armadas e até em muitos cursos de direito e de biologia, essas expressões ideológicas ainda são visitadas. intelectuais como Nina Rodrigues, que apesar de ter uma proposta de política "afirmativa" para o negro brasileiro, irmanava-se a Sylvio Romero na visão cientificista da "inferioridade" do negro. Podemos dizer que política e ideologicamente o primeiro confronto real contra a teoria do branqueamento, então visão hegemônica na sociedade brasileira, foi realizada na prática pelo PCB (Partido Comunista Brasileiro), ao lançar como candidato à presidência da república, o negro e operário marmorista, Minervino de Oliveira, através do Bloco Operário e Camponês (BOC), em 1930.

Outros intelectuais da época, também pagaram seus tributos ao velho preconceito, gerado nas senzalas das casas grandes, mesmo que tenham colocado questões relevantes sobre a problemática "racial" brasileira, como Nina Rodrigues. Gilberto Freire publica seu Casa Grande e Senzala, no mesmo ano em que Monteiro Lobato publica Caçadas de Pedrinho, em 1933. Três anos depois, Sérgio Buarque de Holanda publica seu Raízes do Brasil. Tanto em Gilberto Freyre como em Sérgio Buarque, estão presente fortes traços da visão patrimonialista e escravista, como resultado não só da sociabilidade escravista e agro-exportadora, como também de seu núcleo ideológico legitimador. Para Freyre, o escravismo brasileiro foi "brando" permitindo a "interação positiva" entre escravo e senhor. Para Buarque de Holanda, a sociabilidade da escravidão gera o brasileiro como "homem cordial"! Em 1928 é publicado Macunaíma, de Mário de Andrade, romance que também apresenta problemas,quando avaliamos sua caracterização do brasileiro como o índio aculturado e sem caráter (nacional) e o da miscigenação racial e cultural do Brasil, considerada como negativa, representada pelo imigrante italiano.

Se foi assim com esses intelectuais, se foram produtos ideológicos de uma forma de sociabilidade, não poderia ser diferente com Monteiro Lobato. Em 1918, sai a primeira edição de Urupês, onde está seu o anti-herói Jeca Tatú, matuto caipira, caboclo preguiçoso que encarna o que há de pior no país. Ai não é o negro mas o caboclo, mestiço de branco com índio, que é o alvo da crítica, pelo menos até a década de 1920, quando pesquisas científicas demonstram que a malfadada preguiça do caboclo Jeca Tatú era resultado de doenças várias, presentes no Vale do Paraíba. Imediatamente Lobato escreve um prefácio para seu livro pedindo desculpas a seu personagem, dizendo não saber o motivo real de sua indolência. Seu personagem será utilizado por campanhas sanitaristas de combate as pragas endêmicas em todo o país. Tanto em Urupês como em Caçadas de Pedrinho (1933), estão presentes as contradições de uma intelligentzia hegemônica moldada por uma sociedade que pagava seus tributos a séculos de escravidão e de autocracia oligárquica. Os estereótipos sobre a população não branca, negros, mestiços e índios grassavam em nossa sociedade. Havia também os estereótipos dos imigrantes que chegavam. O italiano comilão, briguento e agitador, o polaco bêbado, o espanhol miserável de sapatos rotos, as lituanas "vagabundas e prostitutas" e tantos outros.

Mas se temos estereótipos preconceituosos nas obras de Lobato, e certamente encontraremos muitos deles, ali também estão balanços críticos de um voraz processo de modernização "pelo alto", típico do capitalismo brasileiro. Em Urupês, e Negrinha estão as denúncias de uma sociedade de burgueses parasitários e de um Estado burocrático, de abusos contra a infância, do preconceito racial. Lobato em suas obras "adultas", desvela um Brasil que é violento contra as mulheres e contra os imigrantes. Temos em Lobato um homem de seu tempo, com as contradições de seu tempo, com as limitações de um intelectual preocupado com o nacional, mas que nunca chegou a ser intelectual nacional-popular, como diria Gramsci. A ruptura e a construção de uma intelectualidade de caráter nacional-popular, afinada com o projeto dos trabalhadores começará a ser organizada a partir de intelectuais orgânicos do movimento operário e popular, como Astrojildo Pereira, Octávio Brandão, Nelson Werneck-Sodré e Caio Prado Jr.

O que depreendemos dessas breves considerações é que obras de importantes intelectuais nos ajudaram compreender o Brasil e a construir elementos analíticos para lutar contra o preconceito, a exploração dos mais fracos e contra o obscurantismo. Tentar censurar Lobato, ou qualquer produção intelectual, estejamos de acordo ou não com ela é cair no obscurantismo. É travar a luta da emancipação humana com "argumentos" de força, os mesmos da inquisição ou do nazi-fascismo. Não se combate a ideologia do racismo com racismo "qualificado". Não se liberta aprisionando. A liberdade e a crítica devem ser nossas armas fundamentais, se quisermos construir uma sociabilidade superior a esta capitalista.
*Antonio Carlos Mazzeo é membro do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro - PCB.