Paulo Schueler*
Na última semana, a
divulgação do relatório "Estado das cidades da América Latina e do Caribe
- 2012" deixou claro: a redução da desigualdade é o principal desafio na
América Latina.
No caso do Brasil, o problema
é ainda pior: sexta economia do mundo, o Brasil é o quarto país mais desigual
da América Latina, ela mesma a mais desigual do mundo. Afirma o Programa das
Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) que, na região, somos
uma sociedade menos desigual apenas que Guatemala (78º economia do mundo),
Honduras (98º) e Colômbia (27º).
Outro dado assustador é que
124 milhões de pessoas vivem sob condições precárias nas cidades
latino-americanas, sendo 28% delas (37 milhões) no Brasil. E "puxamos para
baixo" o resultado da região, pois a média no Brasil é de 29% enquanto na
latino-americana é de 25%.
Pior do que contribuir para a
vergonha de todos nossos vizinhos é saber que o relatório da ONU
"subnotifica" a desigualdade brasileira. O jornalista Clóvis Rossi deu
a senha, em coluna publicada na Folha de S. Paulo, na qual afirma:
"O único metro usado para medir a
desigualdade chama-se índice de Gini... Acontece que o índice mede apenas a
diferença entre salários. Não consegue captar a desigualdade mais obscena que é
entre o rendimento do capital e o do trabalho".
O que isso significa? Que
nosso já vergonhoso quarto pior índice na América Latina não leva em conta os
dados de renda relativos aos ganhos com geração e pagamento de lucros, juros e
aluguéis. Respondam rápido: que país da região passa por uma espécie de bolha
imobiliária?
E o que tem as taxas de juros mais elevada? Em
qual deles está a principal bolsa de valores, com as maiores companhias?
Brasil-il-il!
Sigamos adiante, pela
estrutura tributária do Brasil: de quem o governo mais retira rendimento para
se manter? É mais que sabido que possuímos uma estrutura regressiva, pela qual
a maior parte da arrecadação é proveniente dos impostos sobre o consumo e a
produção. Proporcionalmente, os pobres pagam mais imposto que os ricos, quem
apenas trabalha paga mais do que quem investe na bolsa ou compra títulos da
dívida pública, o que traz elevação da desigualdade.
Segundo o IPEA, um órgão do
próprio governo, pessoas com renda de até dois salários mínimos são responsáveis
por 54% da arrecadação do Estado. Já as com renda superior a 30 salários
mínimos contribuem com apenas 29%.
O quadro torna-se ainda pior
quando lembramos que a estrutura de gastos do Estado privilegia as despesas
financeiras, os juros e amortizações da dívida pública - justamente onde há
ganho de capital.
Voltando a Clóvis Rossi, para termos os números
redondos:
"No ano passado, o governo federal
dedicou 5,72% do PIB ao pagamento de juros de sua dívida. Já o Bolsa Família, o
programa de ajuda aos mais pobres, consumiu magro 0,4% do PIB. Resumo da
história: para 13.330.714 famílias cadastradas no Bolsa Família, vai 0,4% do
PIB. Para um número infinitamente menor, mas cujo tamanho exato se desconhece,
a doação, digamos assim, é 13 vezes maior".
Tantos números não deixam
margem para dúvida: a política econômica levada a cabo pelo PT não resultou em
redução da desigualdade; pelo contrário: faz, a cada dia, elevar-se o abismo
entre pobres e ricos.
Se levarmos em conta as
propostas que o governo tem na gaveta, à espera apenas das eleições de outubro,
como a retirada de direitos trabalhistas e uma nova reforma da previdência, não
precisamos nem esperar: os futuros relatórios da ONU trarão o Brasil em posição
mais vergonhosa...
*Paulo Schueler é membro do Comitê Central do
PCB
Nenhum comentário:
Postar um comentário